quinta-feira, 5 de junho de 2014

A MORTE DE TIM LOPES E A CÂMERA OCULTA

atualizado em 01/06/2022

VINTE ANOS SEM TIM LOPES O REPÓRTER QUE DEU A VIDA PELA NOTICIA
ELIAS MALUCO ENCONTRADO MORTO EM PRESÍDIO DE SEGURANÇA
"A Cocaína é a Mercadoria por Excelência do Capital"
                                      Antônio Rafael
  Em sua obra "Um abraço para todos os amigos" (EDUFF) o antropólogo Antônio Rafael faz uma etnografia do narcotráfico no Rio de Janeiro, do qual retiro essa citação acima. As altas taxas de lucro de uma mercadoria criminalizada, mas que consegue entrar às toneladas sendo consumida por todas as classes sociais, levando-se em conta que um quilo da droga representa razoável quantia em dinheiro, leva seus agentes a ter um exercício de dominação e proteção armada nos territórios onde exercem sua influência. Existe um poder que deve ser considerado apesar das constantes invasões, e tentativas de pacificação através das armas. Este tipo de comercio possui uma estrutura organizacional diversificada, todas elas remuneradas que produz uma atração e dependência entre os moradores, a maioria sem água, esgoto e principalmente meios de subsistência. Dentro desta estrutura diversificada onde se exerce de fato um poder solidamente constituído, as imagens são interditas, mas foram mostradas em programa de grande audiência e motivaram a vingança por parte de agentes que vivem nas sombras, à margem da lei.Em um dia de junho de 2002 quando todos comemoravam a vitória da seleção brasileira, o repórter Tim Lopes que estava a fazer matéria na Vila Cruseiro foi considerado persona non grata.  Foi covardemente atraiçoado, arrastado, julgado, condenado, e sem apelação torturado e barbaramente executado pelos chefes locais da rede criminal Comando Vermelho, na área chamada Grota no Conjunto de Morros do Alemão. O crime foi atribuído ao chefe do narcotráfico Elias Pereira o Elias Maluco que após uma caçada foi preso e conduzido a presídio de segurança em Catanduva.
Dezessete anos sem Arcanjo Antonino, o nosso Tim Lopes Conheci Tim Lopes nos anos setenta no Jornal O Repórter da imprensa alternativa, dirigido por Luis Alberto Bittencourt, O Luisinho, repórter de economia, extremamente talentoso. Na época trabalhava em O Globo, mas corria muito atrás da noticia "por fora" insatisfeito com as pautas insipidas e inodoras, fruto de uma censura oficial. Eram tempos sombrios, mas com alguma esperança em dias melhores, que começaram a surgir em 1979 com a Lei da Anistia. Havia menos assaltos e menos amadores com celulares da ultima geração capturando imagens do cotidiano de uma cidade com grandes conflitos urbanos. Seguindo a máxima dos caçadores de imagens, andava sempre com a câmera na mão, e às vezes com uma ideia na cabeça, e consegui alguns flagrantes de uma cidade plena de contrastes e confrontos. Tim ficou maravilhado com as imagens e resolveu fazer o texto revisitando os locais onde foram obtidas as fotografias e produzindo dois textos de extrema sensibilidade " Mendigos da rua Santana" e "Zona do Mangue". As reportagens citadas além de muitas outras foram censuradas e fizeram parte do Processo contra o Repórter pela Lei de Segurança Nacional-LSN, artigo "Incitamento à Subversão" em 1978 na Policia Federal. Após vários interrogatórios, pressões, apreensões do jornal, o processo foi arquivado. Voltei a encontrar o Tim e trabalhar com ele em 1987 em minha primeira passagem pelo Jornal do Brasil e tive a felicidade de partilhar com ele matéria em dezembro sobre "Indulto de Natal" onde acompanhamos três presos contemplados com a liberdade provisória para as festas natalinas. Acompanhamos os três após a liberação desde a Frei Caneca até seus diferentes destinos. Eram ligados à rede criminal Comando Vermelho. Encontrávamos eventualmente, estávamos trabalhando em lugares diferentes, ele na TV Globo eu na Tribuna da Imprensa. Era o ano de 2002, ano de Copa do Mundo, casualmente estávamos no mesmo vagão do metrô e tivemos rápida conversa. Ele disse que não estava mais fazendo cobertura sobre violência em favelas, mas pesquisas sobre compositores da musica popular com o querido amigo Marceu Vieira. Infelizmente ele resolveu aprofundar a matéria sobre Feira das Drogas e a relação com os bailes funk, e não mais voltou. Tim Lopes nosso camarada nosso Arcanjo viverá sempre entre nós pelo seu trabalho, suas matérias sempre de cunho social. Ele deu a vida pela noticia.