terça-feira, 30 de abril de 2013

OTÁVIO RIBEIRO, O REPÓRTER

A Última Façanha de Otávio Pena Branca, o mestre da noticia. Tive privilégio de conhecer Otávio Ribeiro em sua última grande reportagem :"A Desova do Taxi". Em minha longa trajetória convivi com a nata da reportagem policial, autênticos caçadores de noticias como Albeniza Garcia, Jarbas Domingues, Orlando Silva, José Argolo, José Monteiro e muitos outros que me ensinaram o ritmo certo da apuração em "zonas vermelhas". Com eles aprendi "aonde a banda toca" na hora certa, ou na hora errada, como entrar e principalmente a hora certa de sair. Com o mestre Pena Branca partilhei sua última empreitada no mais autêntico jornalismo de investigação do "maior repórter policial do mundo" segundo a bíblia do jornalismo de combate a revista francesa Actuel. Ribeiro era destaque na capa em reportagem feita em Paris duelando com a nata da reportagem mundial. Ele exibia a revista como um troféu fazendo questão de mostrá-la a todos e dizia com um sorriso sacana: "Engoli todos eles". Estávamos no final dos anos 80, mais precisamente em fevereiro de 1987. Eu trabalhava na Tribuna da Imprensa o combativo jornal da Rua do Lavradio. Havia saído do Globo depois de breve passagem pela Isto é, com muita vontade de fazer a melhor imagem da melhor noticia. Conhecia Ribeiro apenas de vista, quando ele aparecia na revista. Fui designado pela direção da Tribuna para acompanha-lo em importante matéria exclusiva. Após as apresentações, ele pediu para ir com ele até o bar mais próximo, um sórdido pé-sujo ao lado do jornal. ele perguntou onde eu havia trabalhado e disse que deveríamos ir até o local da reportagem para fazer um levantamento da área. "Alcyr, quero ver se você tem medo, porque você vai comigo até um local muito perigoso na Baixada fazer um reconhecimento para ver se meus informantes estão dizendo a verdade". Respondi de pronto: "Oi Otavio tenho medo, é claro, mas pode ficar tranquilo, eu faço as fotos, deixa comigo, você faz o teu serviço, eu faço o meu" Ele sorriu de modo enigmático. Dias depois fomos até o local da desova verificar in loco. O local era totalmente deserto, ficava atrás de uma pedreira. Não passava ninguém, nem de carro, nem a cavalo, a pé muito menos. Nossa viatura era um fusca caindo aos pedaços, pilotado por um típico malandro carioca, boa praça mas irresponsável de pai e mãe. Se houvesse (e não havia) uma rota de fuga, com aquela preciosidade fugir nem pensar, provavelmente seríamos desovados. No meio da empreitada começa um ruído estranho, era a hora do terror, calmamente o Pena pergunta para mim: "Alcyr você usa arma?", respondi: "não, minha arma é essa aqui" e apontei a câmera. Ele riu e mostrou um revolver 38mm cano longo enferrujado, que mais parecia uma peça de museu. A essa altura o motorista foi para dentro do possante tomar um gole de seu inseparável combustível, e arrematou: "Meu possante pode ficar a seco, mas eu não posso ficar com a garganta seca". E sorveu alguns goles da preciosa (para ele) cachaça. Não entendi nada o local era deserto sim, poderia haver uma salva de canhões que ninguém saberia, mas tive um pensamento sinistro, será que iria assistir a uma matança, ao vivo e a cores? No dia marcado uma fria madrugada de um sábado para domingo para o ponto de encontro o Trevo das Margaridas às cinco da madrugada. O o nobre motorista escalado para a missão não apareceu. Motivo simples, havia bebido todas com o dinheiro que o jornal havia deixado em minhas mãos para dividir com o piloto, e eu havia partilhado um dia antes. Foi um erro capital, ele não conseguiu acordar. Marlene minha querida companheira mãe de minhas filhas, não podia me deixar na mão, resignadamente mas cuspindo marimbondos, "botando fogo pelas ventas" resolveu após acalorado diálogo me levar até o local do crime, mesmo sem ter a mínima noção do trajeto.
Otávio, segundo à esquerda orienta os trabalhos foto Alcyr Cavalcanti.
O local combinado parecia um happening à maneira das obras do PAC em vésperas de eleição, retroescavadeiras e dezenas de pessoas foram mobilizadas, comandadas por uma equipe da Delegacia que apurava os crimes na Baixada Fluminense, o responsável era o delegado Luiz Gonzaga. Mas quando iria começar a escavação o dono das máquinas quis ir embora, temendo as consequências. Após muitas negociações ele tremendo de medo alegava que as máquinas estavam com defeito, e resolveu abandonar a área dando ordens para os operários recolherem as retro. Aí entra em cena toda a paixão do maior de todos os repórteres. Como que possuído por uma entidade Otávio pula em cima do capô do carro impedindo o motorista em avançar. Em seguida arranca o dono das retroescavadeiras do interior do carro arrastando-o pela estrada e aos berros obriga a cumprir o combinado. Todos os presentes ficaram paralisados, eu também. Nunca tinha visto, nem nunca mais iria ver algo semelhante. De fato, Otávio dava a vida pela noticia. A matéria foi feita, o taxi foi retirado após horas e horas de escavação sob um sol inclemente de cinquenta graus da Baixada Fluminense, e publicada em destaque na Tribuna. A ação foi também acompanhada por equipe da TV Bandeirantes com o famoso repórter João Batista conhecido como JB. A revista Status publicou dias depois extensa reportagem com fotos de João Bittar.
delegado Luiz Gonzaga examina o taxi foto Alcyr Cavalcanti
Otávio Ribeiro o Pena Branca era de fato o melhor entre os melhores, muita coisa poderia ser escrita sobre ele, que se estivesse vivo poderia passar seus ensinamentos, sua malandragem para as futuras gerações de jovens repórteres que de fato estivessem em busca da verdade por detrás das aparências. Pena Branca faleceu meses depois vitimado por doença incurável.